Antes do dia de ontem, havia uma série de assuntos graves que prendiam tenazmente a minha atenção e marcavam presença constante nas minhas orações nocturnas e vespertinas. Antes do dia de ontem andava deveras preocupado com a crise mundial do petróleo, com o degelo das calotes polares, com os sucessivos e ameaçadores surtos da gripe aviária, com o braço-de-ferro entre Muçulmanos e Ocidentais, com a sexualidade de Cláudio Ramos e com as mais que prováveis invasões alienígenas. No entanto, ontem tudo mudou. Ontem, pela primeira vez, ouvi relatos na primeira pessoa sobre o que é sofrer de hemorroidal. O meu mundo, as minhas crenças e preocupações, foram abanados com se de um sismo de 9.5 na escala de Richter se tratasse. Tinha ficado chocado quando vi fotografias de cadáveres de aldeões bósnios queimados e mutilados, mas devo-vos dizer que quase se soltaram lágrimas de terror quando ontem ouvi a expressão (interrompida por soluços de choro) "Parecia... que tinha aqui uma... bola de golf"... Bem sei que há doenças que matam de formas horríveis e para as quais não há cura, mas as hemorróidas, meus amigos... Essas não matam, mas esqueçam a vossa honra, dignidade e orgulho próprio. Imagino que haja muita gente por esse mundo fora que se sinta à vontade, ou até goste, deste flagelo, acredito até que haja muitos que mereçam a presença de umas quantas bolas de golf no esfíncter, mas ainda assim sou incapaz de desejar isso a alguém. Nem ao meu pior inimigo. Não depois do que ouvi ontem. O que ouvi ontem fez-me ver as coisas de uma forma diferente. A partir de agora vou ter mais cuidado com as amizades. Ouvi dizer que aquilo se pega. Bem sei que aquelas pessoas precisam da nossa compreensão, mas não precisam de estar sentadas ao meu colo para as ouvir. Já inventaram o telefone, o telemóvel, o Messenger...